quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Letras Soltas

Na cidade
Um olhar perdido,
Um amor achado.
O cheiro da fumaça;
O incômodo da superficialidade.

Pelas ruas da cidade,
Uma vida inacabada,
largada à violência desmedida
Resta o grito mudo da massa,
E medíocre é a superioridade.

Na vaguidão da sociedade,
Critérios se perdem invertidos,
Ruidosos sejam os desencontros marcados,
Saudoso seja o silêncio da raça
Subjugado por nossa sonora realidade.

Extinta a consciência da humanidade
O ódio de amores interminados
Embarga o caminho da paz em corações partidos
E não há quase, amor que bem faça
A quem se apraz de avançada idade.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Velhice Urbana

Como novos trens correm estes janeiros
A deixar a estação da juventude
Todos a bordo!, abandonam suas virtudes
Partindo sem medo, os velhos jovens obreiros.

Como loucos, correm sós, sem parceiros,
Todos aqueles que, em sua solitude
Escondem-se em seus hábitos de natureza rude
Esqueceram-se dos valores, ó meros passageiros

Esta imensa confusão que o concreto causa à essência
Apenas lhes permite ver, atrás da cegueira de alma
Que a tudo veem muito claro, em meio humano

Enquanto o ritmo desenfreado desta eterna turbulência
Maltrata-os pela desfocada esperança de calma;
Aprisiona pesadelos e realidade, iguais num mesmo plano.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Obsolência

Me reduz a alma a confusão, tirando dela toda a paz
Este pesado fardo que a mim é tua existência
Agora se cria grave, presente e austera consciência
Mudando os caminhos deste objetivo sem espírito, tenaz

Altiva a desconcordância, a alma se esgueira fugaz
Desconsidera toda a pura e fria essência,
Nutrindo por toda a firme razão, firme (e obstinada) carência
Nos passos turvos de ânsia que esta caminhada lhe traz

Mas persiste, por fim, inexistente, qualquer infelicidade
Pois tendo ao pouco necessário a somente se viver
Comunhão e equilíbrio vêm a quem lhes atribui necessidade

Então se acaso feres o instinto, caindo em falência de atividade,
O coração, de instintivo bom senso humano o volta a conter
Pois aqueles prostrados aos pés do desejo encontram finalmente.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Más notícias...

Os temporários vitupérios improdutivos voltaram trazendo consigo um reservado desejo de morte como daqueles antigos, dor aguda e inconsciente. Inconsciente e, é claro, superficialmente sem causa. Mas qual foi o homem que decidiu, por nós todos, que toda dor e toda angústia tem de ser causada por algum motivo digno? Pois, caso encontrem o sujeito, digam a ele que tenho objeções concernentes. 
Ora, se nem mesmo as causas daquele maldito amor pode encontrar o homem conhecedor, e nem mesmo o soluço -sim, o soluço, aquele que temos na dignidade ignorante do jantar em família- foi explicado, por que raios devo saber da minha própria dor? Passa a saudade, passa o carinho, passa a vontade, e que culpa tenho eu desta minha condição de sofredora dos inconstantes pulsos de indecisão e angústia? Que culpa tenho eu de tantas vontades mal pagas? Que culpa tenho eu de habilidades tão escassas? Que culpa tenho eu de tamanhas dores?
Pois possuímos o destino em sonho, mas ele não o condiz; possuímos crenças incrédulas e ninguém percebe, ninguém sabe como não viver para criticar e sim para ajudar; não tem culpa, mas dói como se tivesse. Culpar, aliás, é muito difícil, por ser o mais fácil a se fazer.
Já explico; antes mesmo das fatais respostas que os explicadinhos possuem sempre guardadas em sua vasta bagagem: Se o sonho condiz com a realidade, não é mais sonho, e coitados dos sonhadores, desamparados; Os realistas não saberiam lidar com sonhadores desamparados; Ficariam todos loucos. E por que não um mundo só de realistas? Muito prático, muito calculado. Até que chegassem por fim à loucura da falta de beleza que os sonhadores -bons amantes, por sinal- espalham pelo mundo como desapercebidos. E é provável que esteja bem aí a grande diferença entre os sonhadores e os não sonhadores: um simplesmente vive, enquanto o outro planeja e cria vida. Vidas. Ou não tão vidas assim.
E nesta explicação eterna onde eu me confundo e falho em todo o resto, nesta interminável -até terminar- resolução mal resolvida da vida, perdeu-se mais uma vez o encanto, ganhou-se mais uma vez aquilo que já foi dito. Mas continuamos vivendo nesta condição miserável de existência rebelde e acomodada ao mesmo tempo, continuamos pois é natural, continuamos sofrendo por obtenção de prazer -outra questão não explicada-, continuamos e, sinceramente? Admito sim que esta mudança eu não quero admitir. Nem você.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Filhinho,

- Olha aqui pra mamãe, olha? Quem é o nenê? Quem?
- Filhinhô, fala ma-mãe. Ma-mãe. Coisa linda!
- Filhinhô, vem cá, vem. Assim, um pézinho primeiro.. isso! Parabéns!
- Filhinhô... tira a mãozinha daí, tira...
- Filhinhô... não põe isso na boca não, faz dodói!
- Filhinho, sai de traz do fogão, sai!
- Filhinho, acorda, hora da escolinha.
- Filhinho, acorda, hora da escola.
Filhinho...
- Filhinho, que notas são essas, hein?
- Filhinho, senta aqui que a gente precisa conversar...
- Filhinho, onde é que você vai? - minutos e explicações depois - nada disso, nem pensar, filhinho.
Filhinho, filhinho...
- Filhinho, tem certeza que você quer isso mesmo? 
- Filhinho, estou tão orgulhosa...
- Filhinho, hoje você vai dormir em casa, né?
- Filhinho, que é isso aí no seu bolso?
- Filhinho, quem é esse aí na foto? E aquela?
- Filhinho, quem é essa?
- Filhinho, ela não é meio... estranha?
- Filhinho, e a faculdade, como vai?
- Filhinho, terminou com ela? Ainda bem.
- Filhinho, outra? Assim, de repente? É boa moça?
- Filhinho, a de antes era tão mais legal...
- Filhinho, espera um pouco, vocês são tão jovens, tem certeza?
- Filhinho, você sabe que pode voltar quando quiser, né?
- Filhinho, ela cuida bem de você?
- Filhinho, como assim, "filhinho"?
- Filhinho, quando é que vocês vem?
- Filhinho, papai está muito mal...
- Filhinho, eu estou muito mal...
- Filhinho, adeus.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A Mão

A mão veio se achegado, ainda distraída mesmo, sem saber para onde se rastejava. A outra estava ali, sem tristeza, nem felicidade; apenas estava.
A mão chegou perto, e ainda que algo a puxasse, só continuava pois ainda não tinha aonde ir. Não percebia, apenas vivia aquela busca por nada. Tocaram-se.
Mas foi sem querer, do nada, como podia aquilo? Um simples toque. Tudo aquilo.
O toque foi involuntário, mas mais involuntário foi o que o seguiu. Uma sequência, uma frequência, só de toques, entre aquelas duas mãos, agora um tanto úmidas de um suor repentinamente frio; muito ávidas daquelas toques instintivamente quentes.
Passou a primeira mão a envolver a segunda com seu gesto um tanto -muito- evasivo. Ela cedeu, ainda que fingindo não perceber. As respostas eram impulsos, os impulsos tomaram consciência. Uma consciência meio escondida, uma distração. Os olhos seguiram a mão. Encontraram-se. Um impacto, quase vacilaram, os olhos, subitamente começando a pensar em olhar para outro lado, mas a curiosidade era maior do que a própria hesitação involuntária. Mantiveram um mesmo olhar, curioso, impreciso, um tanto vacilante, mas sempre ali, no outro. Tentaram entender. Foi impossível.
Que era aquilo? Quem era aquela? Só pôde continuar ali, olhando para ela, com as mesmas mãos, agora ligeiramente trêmulas. As mãos estavam bem ali, como sempre estiveram, talvez esperando, talvez apenas estando, mas não importava, nada importava além daquilo, além das mãos. Envolveram-se mais e mais, sem desviar o olhar, e seguraram uma a outra, com força. Nada era dito, e nem de dizeres havia necessidade, naquele mar de obsolências abstratas que chamavam vida -isso antes daquele momento, mais tarde seu significado viria a mudar- a não ser, aquele momento. A não ser aquelas mãos.

domingo, 30 de setembro de 2012

Falhas

Cada dia se torna mais estranho observar que os atuais moldes da sociedade formam hoje um novo conceito de pseudo feminismo, cujas características nada seguem senão uma linha de raciocínio puramente oposta às raízes daquilo que se denomina feminismo, realmente. 
As gerações atuais preocupantemente entendem por feminismo uma explícita (explícita sim, a quem ainda detiver a capacidade de pensar claramente) depreciação da imagem feminina, tomando-a erroneamente por bela.
O exibicionismo gratuito do corpo feminino vem sendo aplicado à sociedade de maneira subliminar, tendo como desculpas a pobreza e a sub cultura característica dos morros e comunidades carentes brasileiras, assim como tantos outros comportamentos deploráveis que o pobre tem, usando sua condição social como pretexto para tal.
é de fato muito cômodo fazer uso dessas tais condições de modo a causar impacto na sociedade, e o pobre descobriu isso. Acontece que tais impactos não prejudicam apenas a sua vida, como também a sociedade de modo geral.
Enxergar como patrimônio cultural nacional algo imoral não é inconcebível, antes, observa-se já atualmente esta consideração; o inconcebível da situação é permitirmos que se façam usuais as facilidades fornecidas pelo próprio Estado a essa cultura de violência, comodismo e animalizado que contribui infinitamente para a desmoralização do cidadão de bem. 
Não existem preceitos quando se trata da "arte" aplicada, mas sem dúvidas existem, e não devem continuar sendo ignorados, preceitos concernentes à educação e à própria dignidade humana, que, não é necessário muito para se enxergar, está sendo ofuscada pela alienação da massa e torna-se obsoleta em nosso país. 
Existem preceitos quando se trata do futuro da nação. Existem preceitos quando se trata de real incentivo à cultura e projetos sociais de eficiência e qualidade. Existem preceitos quando se lembra que somos seres racionais, adaptáveis e sofredores de diversas evoluções, e que temos em nossas veias, necessidade viva em correr atrás de nossas próprias evoluções. 
E ignorar estes preceitos é o que mais torna falhos os nossos programas de governo, nossa educação e nosso planejamento familiar, causando os problemas sociais que estamos habituados, acostumados e acomodados a ver sem procurar solução, fazendo piadas a respeito, como se não interferisse diretamente em nossas vidas.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Retrato Melhorado

- Que há de errado com você? - Suspirou desiludido, afundando-se na poltrona e naqueles pensamentos da essência.
- Assim, de errado, nada. Por que a pergunta?
- Estou cansado. Provavelmente não sei mais do que estou falando.
 Sempre sabia do que falava, ela pensou. Sentada de frente para a penteadeira, tirava agora os brincos, enquanto ele a fitava com algo que apenas não demonstrava sentir.
- Você parece cansada também.
 Um dos brincos caiu quando ela foi colocar sobre a penteadeira. Abaixou-se para pegar e ele permaneceu sentado, uma mão jogado ao ar, a outra pressionando o copo contra o peito, ainda forte em virilidade e sadio. Bebeu pelo canto da boca um gole do uísque que fora mais aprazível, um dia.
- Ando apenas um pouco enfadada, Roberto. Nada demais.
- As crianças do coral?
- Também.
- Lhe aborrecem muito?
- Nada demais, já disse. E você?
- Eu o quê?
- Você está assim por quê?
- Trabalho, não importa - Deu de ombros - Perguntei primeiro.
 Abriu de leve aquele sorriso cínico entortando os lábios, costumeiro quando se davam seus gracejos.
 Ela ria, olhando para ele pelo espelho da penteadeira, enquanto se ajeitava calmamente. Ele ainda tinha seu charme, aquelas mangas da camisa bem dobradas e as feições inteligentes e sarcásticas, embora ligeiramente envelhecidas, ainda transmissoras de peculiar altivez.
- Você é engraçado. Ainda.
- Não diga - Coçou o queixo, não muito surpreso.
- Começa essas observações aleatórias e nunca se sabe onde vai parar.
 Deixou de lado os brincos, a escova de cabelo e o próprio espelho, virando-se na cadeira para botar firmes e atentos os grandes olhos azuis sobre ele, como fazia ao tentar adivinhar o que ele pensava. Ele se mantinha estático em sua condição irônica beirando uma excentricidade meio misteriosa, meio "meia-idade", e no riso retorcido franzia a testa, de graça, desconcentrando-a de uma vez, ao arrancar dela uns bons sorrisos. Dentro dele, porém, aqueles olhos é que eram os do desconcerto.
Sentiu-se vivo ali algo que por vezes parecia meio agonizante, meio moribundo. Sentiu-se quente e vivo.
- Eu te amo. Ainda.
- Você e isso de "ainda". Coisa daquele seu amigo que parece amiga.
- Por que tanta perseguição com ele, ciúme?
- Ora, vamos, nada disso.
- O que, então?
- Não é ciúme, minha cara. Ledo engano. Acho apenas companhia desnecessária a da pessoa dele.
Ele agora se mexia um pouco na poltrona, talvez um pouco desconfortável, até arrumar-se por fim com a perna direita sobre a esquerda, ambos os cotovelos sobre os braços do estofado, cruzando-se as mãos no ar, fechando uma espécie de base onde apoiou o queixo, muito austero, observando-a falar e mexer o cabelo. O copo, deixou sobre uma mesinha.
- Mas não disse que me ama.
- Não preciso dizer, sei bem disto e você também sabe - as mãos firmes faziam o rosto subir e descer quando falava, uma cena um tanto cômica - As palavras por vezes não se fazem necessárias, posto que são apenas consequências.
- Consequências de que?
- Dos fatos.
- E os teus fatos, quais são?
- Estes teus olhos curiosos que você tem aí na cara. Eles são os meus fatos.
 Continuaram a se olhar, ela agora mais satisfeita, com seu belo vestido de renda de tom pastel, uma mulher elegante. Ele a pediu que o tirasse.
- Que você disse?
- O vestido, tire.
 Tirou.
- Venha, aproxime-se - Bateu na perna, agora não estavam mais cruzadas, e sim abertas - Sente-se aqui.
 Ela foi até ele, pegando o copo e arrematando o último gole do uísque. Sentou-se em seu colo. Mexiam um nos cabelos do outro.
- Então, diga que me ama.
 Ele deslizou o dedos pela cintura, olhando fixamente em seus olhos, como se estivesse de fato hipnotizado pela embriaguez que eles particularmente possuíam.
- Não só te amo... como lhe faço ainda hoje um filho, ou não sou mais eu.

A Pulga

A pulga pulou veloz por montinhos de pelos vagarosamente mornos, ainda adormecidos. Fez seus caminhos sucintos, pisando em seu destino inegavelmente previsível de cumprir, no maravilhoso ciclo da biologia, seu dever de mercenária, aos humanos, vilã.
O gato, gordo e preguiçoso, a satisfazer estereótipo de criação humana ou divina, descansava pesado em alguma parte quente daquele ambiente, após o almoço que não lutara para conquistar. Por vezes, abria os olhos lentos de sono, a lamber alguma parte do corpo ou ajeitar-se mais confortavelmente, não se importando com razões ou essências. 
As formigas da cozinha em austeridade incomparável engenhavam uma trilha, inscientes da perfeição que lhes era atribuída, galgando apenas, e apenas almejando um pouco para sua rainha de naturezas irracionais. 
O açúcar era inato, mas se acaso fizesse graça de prosopopeias, seria de incomensurável aprazer que houvessem tão magníficas criaturas deleitando-se em sua monótona condição de ser figurativamente vivo.
Já o homem, ah, o homem... Dono de polegares opositores, vítima dos mais variados amores, pensador de furtivos ardores; o homem, nauseabundo diante de tão patéticos seres, altivo e detentor de sabedorias complexas e paradoxalmente irônicas entre si, permanecia sentado em seu trono de superioridade, arquitetando as mesmas coisas que ninguém ousava interpretar de outra forma que não fosse a própria, do ego. O homem nada sofria se não suas próprias dores; o homem em nada cria se não naquilo que lhe era conveniente crer; o homem abusava e nem mesmo se dava conta de que até o mal que a condição humana causava girava em torno de sua egoísta existência. 
O homem imergia em profundos conflitos existenciais, ouvindo por melífluos os cantos mefistofélicos do ser. 
E ainda assim, todos - os da raça humana, é claro - diziam e faziam repetir: "o homem é consciente, o homem é racional", como se fosse esta a maior gratificação deste belo universo de criações tremendas.
E enquanto isso, há pouca distância (no aspecto físico) daquele ser de obscuras entranhas, continuava a pulga a se alimentar do sangue do animal preguiçoso alimentado pelo homem, O Grande, até que por encargo de seu destino, tão fétido e tão inferior quanto seu próprio ser, simplesmente caiu morta, e morta ali ficou, no pelo morninho do gato, no colo arrogante do homem encerrando assim, o maravilhoso ciclo da biologia irracional.

sábado, 22 de setembro de 2012

Sobre Felicidade e Poesia


Era apenas uma questão de ser feliz. Observava de minha particularidade, o mundo, e como ele buscava a felicidade. Todo mundo quer ser feliz. “eu não vou sofrer por amor, eu nasci para ser feliz”. Qual o que, a semana seguinte já seria regada a choro de moça virgem trocada por uma loira boa, daquelas que todo homem gosta. Eu pensava comigo, naquela influência mundana, no que me faria feliz. Menino sem jeito viria, em breve, a ser homem sem jeito também. Na falta de jeito, não encontrava nada para me fazer feliz. Ou melhor, encontrava sim; o tal do amor, ele parecia que fazia a gente feliz.
Mas é que às vezes o amor parece tão distante, tão banalizado. Mulher não sabe amar. Homem também não. Talvez eu é que não saiba, mesmo. Mas a questão não é o amor, e sim a felicidade.  Porque por mais que haja amor, pode não haver felicidade, e assim não pode, assim não dá.  Se não há felicidade nesse amor, melhor então que não haja mais amor. A tal da felicidade é o que importa, no fim. Finalmente, encontramos o que realmente importa. Ou talvez não. Pra mim essa felicidade não é bem assim, porque pra mim nunca nada é bem assim.
Isso de normas morais, estruturas psicológicas, nunca entendi. Por que ser feliz? Por que ter dinheiro? Por que viver com uma loira boa daquelas que todo homem gosta? Na verdade, corrijo-me: as morenas é que são boas pra se viver, as loiras são melhores por fora. Para se viver é melhor uma dessas simples, nada de muito sensual e extraordinário, que é pra não chamar muita atenção alheia, só dentro de casa. Por que afinal? Ser feliz é bom, é. Ser feliz não é possível quando se sabe demais, diziam. E não é mesmo, veja bem: a tal da morena, boa pra se viver, ela mesmo, parece bem simples, parece bem boazinha, mas quando se vira as costas, ela também arruma outro por fora.  Quem não sabe, vive bem. Quando se descobre é que a coisa desanda. A ignorância, linda ignorância, ela é que é o segredo da tal felicidade. Tá, tá, vá lá, bela felicidade essa. Mas ser feliz, ser feliz sem poesia: qual é a felicidade de ser feliz sem poesia? E qual é a poesia que é feliz? Onde está a poesia dessa felicidade impulsiva, sem limites? Esse é um oceano onde todo homem, toda loira, toda morena e toda moça virgem mergulham de olhos abertos em busca obstinada pela maldita felicidade. Ora, quem mergulha de olhos abertos no sal desse mar amado que não é de Jorge, morto de poesia, tem logo os olhos feridos, ardem como o cão.
Poesia é melhor que felicidade. Poesia não é feita de felicidade. Poesia, poesia nasce de morte, poesia nasce de falta de entendimento, ou de entendimento demais, poesia. Satisfação poética, talvez se assemelhe a felicidade, aquela sensação de incomparável prazer que se sente ao terminar o último verso, ao deixar um ponto de interrogação ao invés de ponto final, então, é coisa linda de se fazer. Não muito disso é o que se salva quando se tem felicidade. O amor talvez resolva estes problemas, daquilo que o homem enganado chama “falta de inspiração”.
Esse amor, necessidade minha de sofrer para expressar a poesia da alma. Esse amor, necessidade de suprir felicidade, em necessidade de se ter poesia, viver de poesia, viver de nada, viver de abstração, de filosofia vã, de tudo. Viver do vazio de amor, viver do que se faz quando se tem um vazio de amor, viver de ausência, falta da vida propriamente dita, e viver até mesmo da morte de espírito alheia. Vou mesmo é me esquecer da loira, da morena, esquecer de ser homem, esquecer das eventuais falhas, que agora já não mais exercem o papel de evento, mas tornaram-se característica firme e concreta em mim, homem, menino, triste. Triste de amor, triste de ausência, triste de felicidade, triste por qualquer outro motivo, mas triste sempre por poesia, viva ou morta, triste ou não, mas poesia. E poesia feita de falta de felicidade. E que fique bem claro: não me importa a felicidade do mundo, ou o que ele procura. Eu me importo é com poesia, eu busco é poesia. Felicidade é obsoleta.
 

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Confissão


Sou jovem então, tendo tempo a errar
Mergulharei a desmedir este excesso
Digno por hora, contudo, confesso:
Descobri por fim, sou incapaz de amar

Sentimentos não soube controlar
Ou de maneira alguma, razões meço
Pelos males, com pesar me despeço
Deste presente incurável cuidar

Assim de vitórias, foi perdedor
Cuidando que houvesse tal bem, comum
Quando era tudo em verdade, ilusão

Assim de concretos, foi vaga dor
E aquilo que acreditava ser um
Transformou-se loucamente em milhão

sexta-feira, 13 de julho de 2012

O Homem Sem Sentido

Acordou com o cachorro lambendo sua cara. Fez-lhe um agrado, sentou na cama para olhar as horas. Vestiu a camisa florida, calçou os sapatos e deu comida ao seu fiel amigo. Pegou algo na geladeira, talvez cerveja. Bebeu tudo em alguns goles. Apanhou o maço de cigarros e a carteira em cima da mesa e saiu pelas ruas movimentadas daquela cidade fria. Acendeu um cigarro; um leve desgosto lhe atormentava, mas desgosto por desgosto, é parte da vida. Não tinha mulher, não tinha chefe, não tinha nome. Qual seria o sentido daquela vida? Não possuía nenhuma habilidade eminente, nenhum talento específico, nem tampouco fora agraciado com algum dom divino. Era tão vazio quanto o modo como as pessoas se movimentavam ao seu redor, e aquilo lhe causava uma sensação estranha. Mas aquela sensação era vaga, como as memórias que tinha, vaga como o próprio tempo e o próprio espaço eram um mistério.
O caos queria se estabelecer em sua mente, algo como uma confusão na alma e um estado vertiginoso em seus pés, por não saber ao certo aonde estava indo. No entanto, aquilo tudo ele conhecia, e por mais que não entendesse, sabia lidar com a situação. No final, nada ali o fazia sentir de fato algo. Nenhum desejo, nenhuma esperança, nenhum afeto, nada. Era oco. Era simples e oco. Típico. Não se surpreendeu. Ao contrário, acendeu outro cigarro na ponta do primeiro. Enquanto dava o primeiro trago, com ar melancólico e filosófico olhava as crianças brincando. A infância só não lhe assustava mais porque depois de tanto tempo, era como se nunca tivesse passado por ela. Era homem que nascera do nada. Em lugar algum. Era alguém, mas ao mesmo tempo, nunca fora nada. 
A vaguidão de se viver é mesmo uma coisa louca. Um dia você é alguém, e no outro, sua vida faz tanto sentido quanto uma piada não terminada. Daquelas bem intrincadas, que só se entende se o final for bem contado. A vida daquele homem talvez não fizesse sentido. Mas, afinal, qual seria o sentido de ter uma vida com sentido, dessa forma?
Sentiu, por fim, que deveria parar de pensar; aquelas perguntas não possuíam respostas para os céticos e desesperançosos.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

A Triste História de Uma Escritora de Mentirinha

Tragédias Nonsense Antes do Almoço

O cão balançava o rabo. O sapato irritava e os pés doíam. Os ponteiros do relógio giravam, naquela vertigem constante e tendenciosa, fazendo tudo parecer grande. Ou seria pequeno? O cão dormia em pé. O telefone tocava, irritante. A mulher gritava, irritante. Atrasada, como sempre. A janela revelava frustrações, o livro revelava muitas coisas incompreensíveis. O barulho também incomodava, mas era bom. O cheiro de cigarro era insuportável, e a situação era insustentável, como sempre. 
Aquilo tudo não passava de sonho, não? Não, mas é claro que não. Música depressiva e nenhum som de passos na escada surgia para confortar aquela noite fria. Mas não era mais noite, agora, ontem, antes. Era nada. Era hora? Quando foi? Deus sabe, não era fácil. Havia gente dançando, mas era só imaginação. Havia amor, mas era só de mentirinha. Havia tanta coisa que não vai caber na lista. Havia outra dimensão, a via mas ela não há mais. De repente, tudo mudou, como num passe de mágica. Passe de mágica, impasses da vida. Os ventos do norte entraram pela janela do sul, num momento inesperado. Um beliscão que não foi sentido e um beijo que não existiu. Um buraco no coração e um romance que faliu. Faliram, abriram falência, cansaram da vida. 
Nada ali fazia sentido, a não ser uma saudade aguda e persistente que surgia aos poucos ali, nas vértebras cervicais, entre Atlas e Axis, e doía tanto que não conseguia reclamar. Contudo, aquela saudade também não fazia sentido algum. Saudade de quê? Saudade de quando o mundo era bom. Ora, vamos, o mundo nunca foi bom, e todos sabem disso. Algumas coisas do mundo é que eram boas, em determinada época. Talvez hoje, nem isso fizesse mais sentido. Quem é que pode dizer, não é mesmo? A verdade é que ninguém podia dizer nada, porque não havia nada que não pudesse ser dito. Qualquer coisa poderia ser dita por qualquer um de nós, humanos. Mas quem são humanos? 
Não importa, cara, vamos voltar ao nosso planeta, porque lá o mundo parece bom. 

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Solidão Voluntária

Foi acordado pelo focinho do labrador no peito, empurrando-o na cama e pedindo comida. Abriu um olho primeiro, a procurar a luz do sol. Deu de cara com a janela, brilhando como fogo. Fechou o olho novamente. Fez no cachorro um agrado na cabeça, olhou as horas. Hora de sair daquele bloqueio criativo. Levantou da cama, vestindo as calças e dirigiu-se ao banheiro ainda tão sonolento que chutou a quina da mesa de centro. Típico de maus dias. Amaldiçoou toda a sua condição humana de péssimo ex-marido, péssimo pai e bom  escritor enquanto lavava o rosto. Rosto que em tempos áureos fora tão bonito e fizera milhares de lindas moças perderem a cabeça com seus belos modos e belas palavras, e agora parecia tão carente daquele vigor. 
Ele se perguntava todos os dias porque a vida de um escritor é tão solitária. No fundo, no fundo, sabia responder, mas a resposta não era tão aprazível e sensual quanto a poesia que existe em ser solitário. O escritor, quando solitário, é mais bonito. A multidão é aquele seu público, esperando que ele saia da sua toca com algum drama daqueles bem comoventes, se não com alguma comédia genial. O escritor precisava de silêncio, de concentração. O escritor precisava observar de longe, porque se sentisse as mesmas emoções do público, não saberia explicar no estilo próprio, que o púbico gostava de ver. 
Mal sabia o público, que o que lia era exatamente o que sentia, e que o escritor privava-se de sentir por vocação. Acendeu um cigarro, coçou a cabeça. O cachorro não tinha tempo de ver seu desespero, estava muito ocupado com o pote de ração a sua frente. Sentou-se de frente para a máquina, com o intuito de tornar-se ocupado como o cachorro, mas as ideias demoravam a fazer sentido, bagunçadas na mente. Ideias nunca lhe faltavam. O problema era justamente ter ideias em excesso, porque acabava por não conseguir finalizar ao menos uma. Começou, por fim, a escrever sobre uma mulher irritante e egocêntrica. Ironia do destino ou não, como pensou, o telefone tocou, revelando a voz da ex-mulher. Ele não entendia o real motivo contido em ligar para alguém somente para reclamar da vida, e chegou a sentir pena do telefone, que era obrigado a transmitir aquela voz. Pensamento que tempo depois ele achou engraçado e transformou em poesia, talvez. Desligou o telefone mais inspirado a escrever sobre a tal mulher, e no final, com as gotas de ressentimento que eram impossíveis de evitar naquela situação, matou a pobre coitada, violentamente. Sentiu remorso, pois ainda era um homem pacífico, e ela não fora ruim a vida toda. Muitas vezes, aliás, ela lhe fez feliz. Decidiu voltar atrás, pois no que escrevia ainda era possível que fizesse isso, e tirou a morte do destino dela. Por bondade, inclusive, colocou-a no altar com o homem bom da estória, que, de uma forma bem distorcida, era ele. Achou aquilo bizarro, lendo depois. Como é que seria possível aquela coisa toda acabar daquele jeito? Não havia possibilidade de aquele casal existir, ele havia sido extinto há dois anos. 
Bobeira, pensou. Tirou o casamento dela, colocou no lugar um agradecimento sincero, como se ele fosse um herói indiscutivelmente incrível. Riu ao acabar de escrever aquilo, pensando na possibilidade de um dia a ex-mulher agradecê-lo por algo. Deixou daquele jeito mesmo, talvez, se  ela resolvesse ler, entenderia que estava errada. Mas aí, veio o ego, falando alto. Não quis dar o braço a torcer fazendo indiretas para a mulher que um dia amou, mas dizia ser apenas coisa de adolescente. Arrumou milhares de finais para aquela estória, gastando tempo e papel, sem perceber de uma vez, que estava fazendo exatamente aquilo que, a princípio, em toda a sua criação poética de magnitude e orgulho, ele repudiou do fundo da alma: o sentimento, a emoção e a aproximação do escritor a tudo o que é vivo. 

domingo, 1 de julho de 2012

Diga Oi Ao Sr. Osvaldo!

O Sr. Osvaldo é o nosso mascote desde que eu o encontrei, na casa de uma amiga. Ele veio para a Cratinolândia ainda muito pequenino, e aqui ele cresceu, forte e saudável. Só tem um problema: ele é míope.  É, no entanto, um ótimo porco imaginário de estimação: simpático, esbanja carisma e charme, é muito carinhoso e adora brincar com todos os nossos habitantes e visitantes cretinos. 

sábado, 30 de junho de 2012

O Amigo Chato.

Ele sempre te encontra, independentemente do lugar onde você está. Ele sempre te reconhece, por mais que você pinte o cabelo, deixe a barba crescer por três meses ou engorde ou emagreça 30kg. Ele sempre lembra do seu pior apelido da quarta série, aquele que te fez entrar em depressão e chorar até o Ensino Médio. Ele nunca muda, ele nunca se cala, ele nunca fala nada de interessante. Ele é o seu maior pesadelo e o causador de todo o ódio que existe no âmago do seu ser. Ele não tem limites. Ele não tem noção. Ele não tem nada de bom. Ele é aquele que vai com você a um jantar à luz de velas no seu aniversário de casamento. Ele é o ser humano que te faz não gostar da humanidade. Ele se acha um grande piadista. Ele se acha um grande rockstar. Ele se acha um grande gênio. Ele não sabe fazer, mas conhece alguém que saiba. Ele sempre sabe de tudo. Ele sempre tem razão. Ele acha que tem a vida mais interessante do mundo, quando, na verdade, a vida dele é tão frustrada e cheia de decepções quanto a sua. Não acredite., Não dê atenção. Não se deixe enganar. Não tente amá-lo ou compreendê-lo. Ele não merece público. Ele não merece amigos. Ele não merece fãs. Ele não merece nada. 
Ele é um monstrinho gosmento, prestes a agarra o pescoço do primeiro ingênuo que parecer amigável. Ele é grudento. Ele é insuportável. Ele é... O Amigo ChatoE é claro que você tem um desses. Todo mundo tem. Você pode até tentar se livrar do infeliz, mas ele nunca te deixará ser livre. Aprenda a viver com seu amigo chato, ou aprenda a matá-lo, logo de uma vez, da maneira mais lenta e dolorosa possível. Um grande abraço a todos os meus amigos chatos!

Frustrações de Rômulo

Chamo-me Rômulo. Nasci e cresci em 12 de outubro de 1961, numa pequena cidade no interior onde as coisas complicadas são simplesmente deixadas de lado. E por ironia do destino, tive uma vida muito complicada. É claro que as pessoas firmes e severas dizem que isto não foi nada, eu mesmo com o tempo passei a encarar tudo como o simples rumo da vida. 
Fui uma criança comum. Tive galinha, cachorro, brinquei de pula-cela, subi em árvore. Aprontei também. Matei passarinho na mão e ateei fogo em crina de cavalo. Fui moleque encapetado igual a todos os outros. 
Durante a época que os entendidos chamam adolescência brinquei de médico, deitei na grama a olhar as nuvens e imaginar as formas que elas tinham, me apaixonei por mulheres da vida e ouvi rock'n'roll de verdade. Tive problemas com a rebeldia, estudei fora, fui crescendo e virando homem, e aprendi a agir como tal, quando na mira de pai ciumento, me casei com uma das mocinhas mais bonitinhas da cidade pensando em outra.
Homem letrado, partido bom. Pai ciumento nem sempre é burro, escolhe bem o único com quem sua filha irá se deitar. Até o dia de sua morte, ela nunca disse que ele estava errado. Eu amei aquela mulher, é verdade. Ela teve um sorriso puro no rosto delicado, e fez questão de passá-lo para frente, tendo a menina, nossa filha, o mesmo sorriso. Não acho que fui pai presente, compreendo. Mas quando pude, eu amei também aquela mulherzinha, aquela menininha tão pequena e tão frágil nos meus braços, no dia em que nasceu. Foi a menina mais forte que eu conheci. Compreendi o avô quando ela trouxe o namorado, cheio de tatuagens. Aquela coisa de conflito de gerações, ciumes que as menininhas entendem como preconceito. Havia sim algum preconceito, mas ela era minha menininha. Bom menino, descobri por fim. Bom homem também, talvez até melhor do que eu fui, admito. Tiveram filhos, eu tive netos. Netos cujos olhos teriam o mesmo brilho daquele sorriso puro da minha amada. Ah, se eu conseguisse olhá-los sem essas lentes grossas e hostis...
Toda a minha vida eu dediquei a algo que hoje não sei dizer se foi amor, paixão, instinto ou simples medo das frustrações e descaminhos. 
O que eu sei é que eu poderia ter tido mais sabedoria. Eu poderia ter vivido de maneira mais complicada ainda. Eu poderia ter feito um circo, eu poderia ter gargalhado quando ela chorou e eu não soube consolá-la. Eu poderia não ter implicado tanto, e poderia ter sido tão melhor, que eu às vezes me pego pensando: eu não saberia viver com algo melhor; porque foi tudo tão ótimo, que não haveria possibilidade de piorar. Eu devia ter chorado mais, eu devia ter estado lá; eu deveria dar mais liberdade, mais amor e mais do meu próprio  sangue à ela. Disseram-me que eu dei. Fico feliz em saber que vou logo me encontrar com ela, deixando estas coisas daqui. Sei que a vida não é coisa fácil. Sei unicamente que nada do que eu fizer vai tornar minha angústia menor, mas contento-me em saber que vivi. E vivi como todo o homem deve viver: feliz. 
Hoje, as dores da vida e as frustrações que tive me acompanham nas noites frias sem o calor da juventude e me seguem pelos caminhos secos e exatos sem a incerteza dos passos turvos de um menino. Mas já não importam as dores da vida e as frustrações que tive. O que importa é ter de fato estado vivo, sendo errado ou não. 

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Puta Mundo Injusto, Meu.

Quando era criança, eu sonhava em ser engenheira. Na verdade, mamãe é quem queria que eu fosse. Mas não, mamãe, não vai dar. Até agora, não tirei nenhuma nota azul em matemática, e tem ainda aquela PP de física, lembram? Mas mãe é mãe, ela entende. Beijo, mãe. Depois, quis ser bombeira. Ora, vamos, menina, com esse físico de filé de borboleta você não consegue nem segurar uma criança, que dirá salvá-la de um incêndio. Planos frustrados. Ah, quem sabe se eu estudasse enfermagem? Deus que me livre! E aquelas feridas horríveis? E esse jeito estabanado? Seria daquelas enfermeiras que matam crianças injetando tarja preta no lugar de soro, ou coisa assim. Não, não. E que tal ser atriz? Comediante? Cara, suas piadas são mais sem graça do que as do Ary Toledo. É, nada de comediante por aqui. Vida de esportista é muito ruim, não vale não. Já sei! Que tal ser advogada, hein? Começa um curso na área, e dali a seis meses já está desistindo. Briga para todo lado. Menina, você já tem dezesseis anos e não sabe o que quer da vida? É uma vergonha, é desprezível. Mas Direito eu não faço não. Não faço nada direito, que dirá fazer Direito. Abortando missão: Direito. 
Se eu me tornar uma rockstar, talvez me levem a sério. Contudo, não sei tocar nem Faroeste Caboclo inteira, melhor deixar a ideia de lado. Eu sinto dizer a todos vocês, mas a única coisa que eu sei fazer desde os quatro anos de idade é escrever. Vamos investir em escrever, vamos escrever todo dia, vamos nos dedicar a escrever sobre tudo e ganhar um público na Internet, a princípio. Daqui a algum tempo, quem sabe eu consiga publicar um livro e entrar na cabeceira das pessoas. Após diversas tentativas de divulgação desastrosas, porém, compreendi que as pessoas que não leem o que eu escrevo são as mesmas que apoiam a cultura de violência brasileira. São aquelas que cultuam  a ignorância brasileira. Com este raciocínio, podemos deduzir rapidamente que  eu sou uma boa escritora. Eu quero ser uma boa escritora. Eu SOU e SEREI uma boa escritora. MAS O BRASIL NÃO LÊ! A culpa agora, eu sinto dizer, não é minha! Como é que eu posso vender intelecto, se as pessoas não compram? Sinto-me ignorada. Completamente ignorada. Mas eu espero que um dia as pessoas saiam desta cegueira infinita, e eu possa trabalhar dignamente. Compreendam que um país só vai para frente com educação. Cultura não é coisa para ricos. Cultura é coisa para quem tem cérebro. 
E todos vocês tem cérebro! Que tal fazer o seguinte: vou lançar a campanha FAÇA UM FAVOR A VOCÊ E AO SEU POVO: DOE ATENÇÃO A UMA ASPIRANTE A ESCRITORA. Compartilhe este link  ( http://danielemolina.blogspot.com.br/ ) em suas redes sociais, instigue seus alunos, professores, colegas de classe, colegas de trabalho. Operários também leem. Pilotos de avião também leem. Secretários também leem. Machões também leem, e eu garanto que eles adoram poesia. Feministas também leem. Homens e mulheres leem. Crianças também leem. Adolescentes também leem. Brasileiros, vocês leem. Eu confio em vocês. 

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Mais Feminista Do Que Nunca

Ele chegou em casa, sentindo a sensação de estar esquecendo algo importante. Estava  exausto do trabalho e faminto, imaginando, em sua pseudo autoridade masculina dentro daquela casa, o maravilhoso jantar que lhe esperaria. Em vez disso, foi surpreendido por um beijo, antes que pudesse ao menos fazer a fatídica pergunta.
- Fiz algo para você.
Pensou ser óbvio ela estar tratando de um jantar especial. Pensou em luz de velas, não viu velas. Pensou até ter esquecido do aniversário de casamento, mas era só dali a dois meses. Deveria ser uma daquelas noites em que ela simplesmente lhe puxava pela gravata e o conduzia até o quarto, sem mesmo sentir o cheiro de arroz e feijão. Torceu para não ser; naquele caso, levaria horas para comer, de fato, algo. Acabou caindo na obviedade que lhe era peculiar:
- O jantar?
- Um poema.
Ela se abriu num sorriso, muito sedutora.
- Como é?
Ainda não sabia comer poesia. Fez cara de quem não entendeu e ela lhe entregou uma folha de papel, de um jeito tão bonitinho que ele não soube perguntar de mais nada. Leu o poema, que por sinal estava tão bonito quanto aquele frango assado que ela fizera no domingo. Ficou se perguntando se ainda teria algum pedaço, mas achou grosseria perguntar. Seus dias de canalhice, enquanto solteiro, lhe proporcionaram sabedoria para negociações conjugais como aquela. Decidiu então, contornar sua mulher com belas palavras, que é como os canalhas fazem. Sabia lidar com aquele tipo de situação sem deixá-la magoada. Era sensível como casca de ovo aquela mulher. Tudo o que se falava, e por vezes também o que não se falava poderia magoar. Puxou-a pelo braço e a colocou em seu colo. Elogiou o poema, o novo corte de cabelo, o vestido e também o bom e velho sorriso de menina. Disse até que ela teria futuro enquanto poetisa. Ela sorriu novamente, do modo mais meigo que alguém pode fazê-lo. Fingiu que acreditava. Por fim, mostrou-lhe a saborosa lasanha que ficaria pronta assim  que ele saísse do banho, e após o jantar, já certa do sucesso de seus planos maquiavélicos, puxou-o pela gola do pijama até o quarto, como a fazer o pobre esquecer por completo da final do campeonato de futebol na TV. 

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Crises de Maria.

Nasceu, lá numa cidadizinha do interior, uma menininha muito engraçadinha, que apesar de tal qualidade, não era lá a criança mais bonita da maternidade, que a mãe não nos ouça. Foi-lhe dado o nome de Maria, por ser o mesmo da bisavó de um amigo da mãe que morrera naquele mês. Quiseram prestar-lhe singela homenagem no nome, mas como era homem, e a criança não poderia chamar-se Claudinei, procuraram na família do tal, uma mulher com nome bom pra se prestar homenagem. Coisa de gente do interior, oras. Maria. Maria era bom. Maria foi ficando uma menina muito bondosa, gostava de ajudar e não interessava o que tivesse de ser feito em benefício do próximo; ela fazia. Maria na creche era uma benção: cuidava mais das crianças do que as próprias "tias". Quando ganhava moedinha, não era o padeiro ou o sorveteiro quem ficava feliz; eram os mendigos da praça, que iam direto ao bar comemorar a bondade alheia. Não existia uma só pessoa que não amasse Maria na escola. Pelo menos não em dia de fazer atividades em grupo. Maria fazia o trabalho, cozinhava para os amigos, comprava os materiais. Eles se encarregavam de brincar de coisas de adulto. No quarto dela, claro. Um dia, numa dessas brincadeiras um rapazinho muito esperto perguntou se ela sabia aquela brincadeira, em específico:
- Sei não, Marquinhos. Papai diz que menina boazinha não deve, não posso.
- Que nada! A coisa é boa, e eu ia gostar tanto se ocê me fizesse esse favor...
 Não foi preciso muito mais do que esta bendita palavra para dobrar a pobre menina. Depois da brincadeira terminar, Maria perguntou o que era aquilo. Marquinhos dizia apenas que era brincadeira de "emprestar os brinquedos". E ela gostou, tanto do nome quanto da coisa em si. Virou um tal de empresta daqui, não devolve dali; e ela começou a entender as coisas. Percebeu que naquela de emprestar, estava era dando tudo; e aí ficou muito triste, porque descobriu que ele se aproveitava dela. Maria começou a sentir algo que o psicólogo chamou de revolta, mas que ela entendia como vontade de matar todo o mundo, simplesmente.
Um dia, Maria decidiu que não seria mais daquele jeito. O primeiro pedido que lhe fizessem, negaria. E assim fez. Uma nova Maria surgia. Agora, tomava gosto pela coisa; saía negando tudo o que lhe pediam; dinheiro, favor, paciência, empréstimo de brinquedos... Maria tornou-se uma mulher terrível. Fez com que o pai obrigasse o malandro do Marquinhos a se casar com ela, só para poder judiar dele. Descobriu porém que mesmo fazendo isso, não conseguia sentir raiva dele. Podia odiar o mundo todo, mas ele não. E aí ela teve outra crise existencial. Não sabia se odiava aquele homem por ser o único no mundo do qual ela não conseguia odiar de jeito nenhum, ou se simplsmente não o odiava mesmo. Descobriu, para a sua infelicidade, que eram as duas coisas, e ainda pior, para seu desespero, descobriu que amava o infeliz. A essa altura o bichinho andava até meio fraquinho, meio doente, porque ela fazia questão de não lhe fazer comida o bastante.
Olhou para o coitado, jogado às traças, esmilinguido, e sentiu algo lhe cortar o coração. Lembrou-se dos tempos de menina. Lembrou-se de como ele olhava para ela; com vontade de lhe emprestar tudo o que tinha, de lhe dar, se fosse preciso, e sentiu-se feliz. A doce Maria voltou para ela, e ela voltou a ser bondosa como era, vivendo pelo desejo de ver aquele brilho nos olhos do Marquinhos, vivendo junto com ele sempre. O Marquinhos a amava, desde sempre, e sentiu-se igualmente feliz com a maneira com a qual ela o olhava e fazia-lhe uma bela refeição, com a que cuidava dele e lhe emprestava sempre seu amor. Marquinhos aprendeu com a adorável Maria, que era bom cuidarem um do outro, e eles tiveram um filho, a quem chamaram João, em homenagem a um mendigo que pedia moedinhas na praça, bisavô de uma das tias da creche, que era amiga de Maria, e morrera, naquele mês, vítima de atropelamento, mas que devido ao seu nome (Luíza), não seria possível uma homenagem direta. Procuraram, na família da menina, um homem com nome bom pra ser homenageado. Coisa de gente do interior, pois. João era um menino muito esperto, de olhos ativos e de rosto risonho; mas, apesar disso, não era a criança mais bonita da Maternidade. Que a Maria não nos ouça.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Boys, Boys.

Existem várias teorias a respeito, algumas relacionadas ao ego, outras à aparências, mas eu, eu mesma, nunca soube qual era de fato o problema entre mim e os homens. A única coisa que posso dizer sobre eles é que os que aproximam-se de mim sem a intenção de me assaltar, ou são da família, ou tem dona. Ou dono, que seja. 
Estive pensando em escrever um livro com os nomes dos rapazes por quem eu já "me apaixonei", e pelas minhas contas seria algo com cerca de 300 páginas. Porém, só existiu um deles que realmente gostou de mim (ou pelo menos era o que ele dizia, e eu já não o vejo há muito tempo. Talvez ele nem lembre mais do meu nome. São poucos deles, aliás, que sabem o meu nome, e muitos os que gostam de fingir não saber. 
Outra parcela também, como dito, tem seus defeitos nas mãos, seja em ouro, em prata, em latão. O que vale  mesmo é a intenção. Deste grupo, eu, por norma moral, faço questão de me afastar ainda mais. Outro grande grupo é o dos que não gostam de meninas. Estes gostam de torturar, com abraços e carinho, com amizade e afins. 
Não se esquece com facilidade daqueles que alimentam suas esperanças, sem querer ou não, pensando nas suas amigas. Não tenho, porém, nenhuma intenção de culpá-los, quando, na verdade, a culpa disso é unicamente minha. 
Muitas garotas culpam os rapazes por esse tipo de coisa, mas eles não são sempre os carrascos. Algumas vezes, por exemplo, é culpa justamente de outras garotas, e eles apenas gostam mais delas do que de mim, ou de você. Todos com o mínimo de bom senso devem concordar que ninguém é obrigado a gostar de ninguém. 
Culpados e vítimas a parte, um dos grupos mais apaixonantes que existem é o dos que não existem. São tão perfeitos os homens que não existem, que é triste pensar nisso. 
Eu não faço a mínima ideia do que possa haver de errado comigo, o que pode causar essa capa de invisibilidade, ou o que se deve fazer para destruí-la, mas independente de ser algo bom ou ruim, acredito que seja possível continuar vivendo dessa maneira, apenas admirando estes belos rapazes que o mundo possui, e que as garotas, bobas, adoram humilhar, mas não são capazes de viver sem. 


Obs.: Eu acho válido lembrar que não estou aqui pedindo críticas e  opiniões maldosas a respeito do que escrevo, e que eu tenho espelho e sei avaliar minhas próprias atitudes, portanto, qualquer comentário babaca será excluído, e eu, com certeza encostarei minha cabeça no travesseiro e dormirei lindamente durante a noite.

domingo, 3 de junho de 2012

Meio Cheio, Meio Vazio

Eu gosto das coisas à meia luz
Eu sou do meio termo
Eu estou presente nas linhas tênues
Naquilo que não é bonito, mas também não é feio.


Eu sou a divisão
Eu não tomo posições
Eu não serei pró nem contra


Eu não vou com você até o fim
Eu só lhe mostrarei os dois caminhos
E que vá você, sozinho,
Sem mim.


Eu não vou adotar as suas ideologias radicais
Nem abraçar as suas revoluções extremistas
Eu vivo imersa num submundo imaginário de flexibilidade
Eu me apaixono com facilidade
E eu não sei viver de outro jeito
Sem ser desse,
Meio desajeitado
Meio sóbrio
Meio doido
Que,
Por incrível  que pareça,
Parece tão desequilibrado.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Complexo, Não?

Estas histórias de amor são... histórias de amor. Por que de uma forma ou de outra são sempre iguais.
Existem aqueles que criaram as histórias de amor. Preferem aquelas tradicionais, do tipo:
"Um ser humano do gênero masculino. Um ser humano do gênero feminino. E um final feliz."
Mas, sempre tem um rebelde, um visionário arrogante qualquer, que vai lá contrariar, questionar as regras, e cria um novo tipo de história de amor. Algo que não seja assim tão fácil, porque afinal, somos "seres humanos", e podemos criar um mundo bem mais complicado do que isso. Surge a evolução das histórias de amor padrão. Transformam-se em algo que toma mais tempo: "Um homem e uma mulher, que se amam. O mundo é contra. O final tem tudo para ser horrível. Mas incrivelmente, fazem do amor um si algo acima da capacidade de compreensão humana. Assim é mais intrigante. Todos os que acreditavam na outra forma passam a acreditar nessa, e talvez a ideia de questionar antes proposta volta a tomar conta das pessoas. Novamente surge um rebelde que diz: "Um homem se apaixona por uma mulher, mas ela despreza seu amor. Ao invés de apenas desistir, o cretino tira a própria vida, por que afinal, "o amor é algo acima da capacidade de compreensão E entedimento humano." Foi o bastante? Um final que não é feliz? Sim, com certeza, todos emocionados!
"EI, EI, esperem! - Diz um deles. - Não pode ser assim!
E todos pensam: "Realmente, não pode."
E esses rebeldes, sempre causando problemas...
O rebelde diz que deve haver comicidade em algum lugar.
Mas algo acontece. A rebeldia, que antes vinha só de um agora toma proporções extremas. Há alguns que mudam os gêneros dos "personagens", há os que condenam essa prática e os rebeldes rebelam-se uns contra os outros.
E enfim, chegamos a nossa sociedade e  pouco importa saber o que é felicidade.

Das Reclamações Que Mudaram Vidas



Tomou coragem. Sabia se tratar de algo difícil, sabia que estava entrando em uma guerra. Sabia, acima de tudo, que aquilo levaria horas, como sempre, seria irritante, maçante, terrível. Mais uma vez, se preparou psicologicamente, contou até dez, respirou fundo e pegou o telefone. De qualquer maneira, não poderia ser um domingo pior. A vida já não estava tão boa. Discou. Sentiu aquele arrepio, e aí a música começou. Abriu um pacote de batatas, uma garrafa de refrigerante, jogou-se pesadamente no sofá da sala. A música ainda não irritava. Ainda. No fundo, todos sabem que tudo é uma questão de tempo até que a música soe como provocação aos ouvidos. Sabia disso. Não se importou. Continuou comendo batatas e bebendo o refrigerante, e assim permaneceu nos primeiros quarenta minutos. Para seu espanto, ainda não começara a ficar irritada. Tudo bem. Tudo está sob controle. Mais batatas. Talvez, alguns chocolates. Quando, de repente, de maneira tão inesperada que não tinha palavras para dizer, alguém atendeu do outro lado da linha. Segue o diálogo mantido:
- Rafael, boa tarde, com quem falo?
- Aaah... Juliana, meu nome é Juliana.
- Pois não senhora, em que posso ajudar?
- Eu comprei um aparelho há alguns dias e do nada, ele parou de funcionar, e eu nunca consegui contatar a assistência técnica.- Sim... Senhora.

- E... Então?
- É só isso, senhora?
- Como assim só isso? Você acha pouco a assistência técnica não detectar o problema? O que mais tinha que acontecer pra você?
- Não, senhora, de maneira nenhuma, eu só...
- Ai, pare de me chamar de senhora que isso me irrita, por favor.
- Sim, e ... Desculpe, é... Juliana. Desculpe. É que esse é o modo como tratamos nossos clientes. Desculpe.
- Ah, claro, de maneira muito respeitosa. Me deixam esperando 40 minutos na linha, desligam na minha cara, e ainda querem demonstrar respeito, como não percebi antes! Lamento em lhe informar, Rafael, mas o seu sistema é um tanto contraditório. Ah, tudo bem, vamos com calma. Desculpe, eu me irritei.
- Tudo bem, Juliana.
- Ah, desculpe, eu não queria ser grosseira, desculpe.
- Tudo bem, Juliana, estou acostumado, sem problemas.
- Pare de ser bonzinho! Eu fui mal-educada, seja mal-educado comigo também, vamos!
- O quê?
- Vamos, desconte sua raiva!
- Mas...
- Vamos, ande logo, diga tudo o que pensou!
- Er... Está certo.
- Grite, pode gritar, vai.
- SUA LOUCA! NEURÓTICA, PSICOPATA! SOCIOFÓBICA, MALUCA!
- Pronto?
- hum, não.
- Prossiga.
- DEMENTE, ESQUISITA! DOENTE, PROBLEMÁTICA, FOLGADA, GROSSA, MAL-EDUCADA!
- E agora?
- Mais um?
- A vontade.
- RETARDADA!
- Só?
- É, acho que sim... Me sinto melhor assim, obrigado.
- Ah, por nada.
- HAHAHAHAHA! Você é DOIDA! HAHAHAHAHAHAHA!
Ela riu junto. Riram por vinte minutos consecutivos. Riram mais. Continuaram até o chefe dele voltar. Colocou-a linha na espera e parou rápido para se recompor.
O chefe parou, olhou rapidamente o departamento todo e voltou a jogar paciência no computador. Rafael olhou em volta, não viu o chefe, voltou ao telefone:
- Desculpe, Juliana...
- Onde você estava? O que aconteceu? Por que você desligou?
- Meu chefe apareceu aqui, eu estava rindo muito e...
- Oras! Você não está trabalhando?
- Sim, mas...
- Seu chefe reclama se você trabalhar? É por isso que nenhum atendente de telemarketing trabalha nesse país? Ele briga com você se você atender o telefone? Mais que absurdo!
- Juliana, acalme-se! Eu estava rindo descontroladamente, ele estranharia. Não ofenda meu emprego, por favor.
- Oh, sim, eu generalizei, desculpe.
- Me diga agora, você é casada?
- O quê? Casada? Eu?
- Ótimo. Quer sair comigo hoje?
- Por que eu faria isso? Você nem me conhece, e se eu for na verdade um velho psicopata?
- Tenho o pressentimento de que não é.
- Pressentimento?
- Sim, tenho ótima intuição, nunca falhou.
- Você é gay?
- Acredito que não.
- Por que um homem que não é gay me chamaria pra sair? Eu sou irritante. Pelo menos foi isso que ouvi dos meus últimos 9 namorados.
- Acho que já pude perceber isso. Mas eu arrisco. 8 horas saio daqui. Café?
- Ainda não consegui me acostumar com a ideia de sair com alguém que nunca vi.
- Até que eu não sou feio, viu.
- É, eu também não. Onde?
Se encontraram. Daquele dia em diante, nunca mais deixaram de se encontrar. Brigavam, é claro, diariamente, principalmente durante aquele bendito sétimo ano, as crises, os vasos quebrados na parede, o stress, as crianças, o ciúmes, o tudo aquilo que se ajeitava depois, por vezes na cama, vezes num jantar ou vestido novo, num chocolate, ou até mesmo com batatas e refrigerante numa tarde chata de domingo (que ficava muito melhor com alguns abraços), mas o bendito aparelho, aquele que não foi para a assistência técnica, hoje deve estar por aí, na mão das crianças, ou até mesmo na boca do cachorrinho de estimação da família. Sabe como é, filhotes são terríveis.

terça-feira, 3 de abril de 2012

O Cansaço

Um belo dia, cansou-se de tudo o que era vivo. E do que não era vivo também. Cansou da vida que levava, do cara com quem dividia a cama, do emprego e da inflação, cansou de sentir o estômago quase explodindo toda vez que lhe atacava uma crise de gastrite nervosa, de ter que ficar sempre aguentando as mesmas ladainhas no salão de beleza, de gente oportunista e mal intencionada, de gente falsa e arrogante, de gente insolente e vazia, dentre outros tipos de gente que deixam a gente com os nervos a flor da pele. Simplesmente cansou, e sabia que aquilo era loucura; "como assim, cansar, mulher? Você agora decide o que vai acontecer a todo momento, como se eu fosse um brinquedinho seu?" Havia cansado desse tipo de conversa havia muito tempo. Foi lembrando-se daqueles velhos questionamentos da fase adolescente, que, pelo resto do mundo é visto como rebeldia, tudo aquilo parecia querer lhe dizer algo. Como pesadelos constantes que a gente tem e não faz a mínima ideia do significado. A comida perdia o tempero, do sexo sumia o prazer, das amigas já não tinha as conversas que outrora foram, em momentos decisivos, grandes saídas e soluções. Contudo, não entendia como havia se acostumado tão rápido; tornara-se uma pessoa acomodada em sua poltrona de gente rica, após tantos anos de estudo dedicados à algo que agora nem sabia mesmo se gostava de fazer. Pensou, algumas vezes, em suicídio, mas aquilo parecia tão óbvio que desistiu. Foi também algumas vezes à igreja, para ver se não era coisa de satan. Encontrou gente demais por lá e desistiu também. Começou a ficar preocupada, poderia ser algum tipo de sociofobia na meia idade, distúrbios cerebrais, transtorno obsessivo-compulsivo ou esquizofrenia. Procurou um psicólogo, um psicanalista, um psiquiatra, uma mãe de santo, uma cigana, um pajé e uma benzedeira. Achou todos uns babacas. Sentia um desejo maior que a própria alma de sair pelo mundo bradando como ele é óbvio e despejando aos quatro ventos a sua decepção com as pessoas que nele habitam, juntamente com as atitudes delas, sempre iguais, mesquinhas, pequenas. Aquilo não era normal para uma mulher que sempre fora tão sensata e equilibrada em suas ações. Ou será que sim? Começaram a surgir teorias sobre essa implicância. Nada muito concreto, mas talvez, assim, analisando com mais sensibilidade, o problema não fosse com ela. Talvez, só talvez, as pessoas do mundo é que fossem o caos. E eram. Parou então por algum tempo, simplesmente para observar o comportamento do ser humano, e descobriu coisas tão horríveis que não foi capaz de descrever. Mamãe nunca lhe ensinara aquilo. Talvez nem ela soubesse. Talvez ela, velhinha e tão boa, tão gentil e doce, nem suportaria viver nesse mundo. E talvez tenha ido embora justamente por sentir que não suportaria a corrupção do homem e sua degeneração. Mamãe era muito sábia, sim. Mas Deus teve piedade de sua pobre alma sofredora, assim como teria de todos os poucos bons que habitam este lugar tão miserável que é o nosso. Era tudo uma questão... De tempo, talvez?

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O Peso Para Papel

Depois de muito pensar sobre o futuro, descobri algo sobre mim mesma que de fato fez muito sentido: eu sou um peso para papel. O homem já foi à lua, o homem já inventou milhões de artigos e utensílios, diversas tecnologias e coisas tão incríveis que eu nem sei mencionar neste singelo texto. Mas o homem nunca foi capaz de designar duas funções para o peso para papel. Isto porque, o peso para papel é tão limitado e incapaz, que seu próprio nome já pode descrever sua única utilidade dentro do escritório. O peso para papel nunca será nada mais que um peso para papel. O peso para papel nunca mudará nada na sua vida. Ele nunca te fará falta. O peso para papel é um daqueles objetos que você só tem porque quer parecer organizado, ou porque era muito barato. Mas por exemplo: um grampeador ou um perfurador de papel podem perfeitamente desempenhar a única função do peso, e por vezes até de maneira mais eficaz do que o próprio. O peso para papel é algo desnecessário, supérfluo, inútil, um completo estorvo na sua escrivaninha. Ele é facilmente substituído por algo que nem foi feito para fazer o que ele faz de melhor. Ou melhor, a única coisa que ele faz relativamente bem. O que aliás, é questionável: dependendo do peso que ele tem, e do tanto de folhas, nem de segurá-las ele é capaz. E você sabe perfeitamente de tudo isso, mas nunca sentiu pena do peso para papel quando parou pra pensar na chatice que é ser ele. Até porque, você nunca pensou nele. Você não ama um peso para papel, e não odeia também. Você é completamente indiferente a ele. Você não olha para ele até o momento em que ligam o ar condicionado na sala e os papeis começam a voar, porque até então, ele é invisível diante do monte de coisas muito mais importantes do que ele em cima da sua mesa. Agora, se coloque no lugar do peso para papel. Sinta-se um completo montinho de nada, um inútil, um ser sem propósito. Não é nada legal, não é nada fácil. Uma pessoa sem moral, que não é e não tem condições de ser levada a sério, é o que eu sou. E é o que eu sempre serei. Um eterno peso para papel. Na escola, na família, entre os amigos, é o que eu nasci pra ser. Nada. Ninguém. Invisível, incapaz. É exatamente isso o que eu vou morrer sendo, e nada poderia mudar, de maneira nenhuma, o curso desta vida sem firmamento. Obviamente, não existe nenhuma mensagem neste texto que não seja um exemplo de como não ser na sua vida. Leve isto para sua vida profissional, e para tudo mentalize sempre: "eu não quero ser um peso para papel."

domingo, 29 de janeiro de 2012

Palavras repetidas, física e John Paul Jones

Eu normalmente diria "era uma vez" mesmo sem nunca ter parado pra pensar o significiado dessa expressão. Eu as vezes me pego pensando nessas coisas que a gente diz sem saber o que significa (Me sinto um daqueles gringos que repetem as besteiras que o pessoal fala pra eles em português achando que é bonito). Percebi isso há algum tempo, mas só lembrei de escrever agora. Ia começar a história com o era uma vez de novo, mas aí... Lembrei (Eu não acharia legal um russo me falando besteiras e eu repetindo, pensando que era coisa legal de ser dita). A menos que bem, ele não fosse assim, um russo qualquer, porque aí a coisa muda de figura e tal... Ando meio assim ultimamente: se ele for bonito, né? Mas não do jeito que vocês estão pensando, nada demais, só bobagens mesmo. Não se deixem enganar por um rostinho bonito, um porte atlético, um 1,80m, um olhar sedutor, um perfume maravilhoso, um sorriso cheio de charme e carisma, e... O que eu dizia mesmo? Ah, sim, o era uma vez. Eu não sei porque a gente diz era uma vez. Por que a gente diz era uma vez? Já repararam que se você fica repetindo a mesma palavra em voz alta durante algum tempo, ela começa a soar estranho? Por exemplo, a palavra colega. Repitam a palavra colega umas vinte vezes e vejam como ela fica estranha. Acontece com todas as palavras, acreditem. Façam isso com o velho "era uma vez". Daí vocês vão entender. É chato ficar fazendo isso toda hora. As coisas andam muito chatas, tenho percebido isso também. Aquele ânimo, parece que foi dar uma volta. Aquela alegria toda, anda meio em falta. Disposição, faz tempo que não encontro. A galera diz que ando viciada em internet. Tanta gente morrendo na cracolândia, sofrendo pra cacete, tendo uma vida dura e eu aqui, viciada em internet. Puta ser humano de merda que eu sou, hein? Mas não tem nada não. Eu sou mais uma no bando. Não se enganem, vocês nem são muito melhores. Na verdade, existem pouquíssimos seres humanos que não são merdas como a gente. Minha mãe é um deles, claro. Te amo, mãe. E não, eu não sou rebelde, pode acreditar. Eu sou uma santa. Tão bobinha. Um dia você vai ver. A vida anda meio complicada. A tendência, todo mundo sabe, é só complicar mais. That's the way. Enquanto tem oxigênio, comida, água e essas bobeiras, a gente vai levando. Foda mesmo é quando começam as aulas. Uma morte todo dia, obviamente na hora de levantar; digo levantar tanto da cama quanto do assento reservado para idosos. Outras mortes nas aulas de física, claro, porque aquilo pra mim é hebraico-mandarin-rock progressivo. Eu juro pra todos vocês que estão lendo isso, que está acima da minha capacidade mental entender física. É tipo um bloqueio, desde a hora de copiar o exercício até a hora que bate o sinal, claro. Uma nova morte para mim após o almoço. Maldito técnico que eu já odeio antes de ter começado. Maldita escola, maldita falta de talento pra tocar baixo. Ah, se eu soubesse tocar baixo, ah... Baixo é um instrumento cheio de estilo, cheio de marra, é lindo. Não existe um cara mais estiloso dentro da banda do que o baixista. O coitado nunca é lembrado, é verdade, mas ele tem estilo. Fica ali, batendo pézinho, discreto, com aquela expressão que ninguém sabe compreender. Exceto Sid Vicious, baixistas costumam ser discretos. Vide John Paul Jones, que é maravilhoso e consagrou-se ali, bem no cantinho do palco do Led Zeppelin, sem fazer nada, de cabecinha baixa, tímido, enquanto seus companheiros atiravam TVs pelas janelas de hoteis, eram considerados símbolo sexual e causavam polêmica com peixes e groupies, mistérios e supostas maldições e muita, mas muita rebeldia na frente das câmeras. Jones largou a escola aos 17 anos pra virar músico de estúdio. Eu com 17 anos provavelmente estarei chorando por causa da pontuação do ENEM ou por medo de não passar na USP. Esta é uma prova, meus caros, de que cada um nasce pra ser alguma coisa, e nada muda esse curso. Não sei, sinceramente, se eu nasci pra ser advogada, baixista ou o raio que o parta. Mas dia 6 já tenho aula e a matrícula do técnico foi muito mais barata que um amplificador, fazer o quê? Era uma vez um texto que poderia ser bom se eu tivesse talento, era uma vez uma jovem que quis ser colunista social, era uma vez uma aula de português sobre coesão textual na qual eu dormi, DESCULPA CARMEM, TE AMO, era uma vez, era uma vez, era uma vez, era, uma, vez...