Era apenas uma questão de ser feliz. Observava de minha
particularidade, o mundo, e como ele buscava a felicidade. Todo mundo quer ser
feliz. “eu não vou sofrer por amor, eu nasci para ser feliz”. Qual o que, a
semana seguinte já seria regada a choro de moça virgem trocada por uma loira
boa, daquelas que todo homem gosta. Eu pensava comigo, naquela influência
mundana, no que me faria feliz. Menino sem jeito viria, em breve, a ser homem
sem jeito também. Na falta de jeito, não encontrava nada para me fazer feliz.
Ou melhor, encontrava sim; o tal do amor, ele parecia que fazia a gente feliz.
Mas é que às vezes o amor parece tão distante, tão banalizado. Mulher não
sabe amar. Homem também não. Talvez eu é que não saiba, mesmo. Mas a questão
não é o amor, e sim a felicidade. Porque
por mais que haja amor, pode não haver felicidade, e assim não pode, assim não
dá. Se não há felicidade nesse amor,
melhor então que não haja mais amor. A tal da felicidade é o que importa, no
fim. Finalmente, encontramos o que realmente importa. Ou talvez não. Pra mim
essa felicidade não é bem assim, porque pra mim nunca nada é bem assim.
Isso de normas morais, estruturas psicológicas, nunca entendi. Por que
ser feliz? Por que ter dinheiro? Por que viver com uma loira boa daquelas que
todo homem gosta? Na verdade, corrijo-me: as morenas é que são boas pra se
viver, as loiras são melhores por fora. Para se viver é melhor uma dessas
simples, nada de muito sensual e extraordinário, que é pra não chamar muita
atenção alheia, só dentro de casa. Por que afinal? Ser feliz é bom, é. Ser feliz
não é possível quando se sabe demais, diziam. E não é mesmo, veja bem: a tal da
morena, boa pra se viver, ela mesmo, parece bem simples, parece bem boazinha,
mas quando se vira as costas, ela também arruma outro por fora. Quem não sabe,
vive bem. Quando se descobre é que a coisa desanda. A ignorância, linda
ignorância, ela é que é o segredo da tal felicidade. Tá, tá, vá lá, bela
felicidade essa. Mas ser feliz, ser feliz sem poesia: qual é a felicidade de
ser feliz sem poesia? E qual é a poesia que é feliz? Onde está a poesia dessa
felicidade impulsiva, sem limites? Esse é um oceano onde todo homem, toda
loira, toda morena e toda moça virgem mergulham de olhos abertos em busca
obstinada pela maldita felicidade. Ora, quem mergulha de olhos abertos no sal
desse mar amado que não é de Jorge, morto de poesia, tem logo os
olhos feridos, ardem como o cão.
Poesia é melhor que felicidade. Poesia não é feita de felicidade. Poesia,
poesia nasce de morte, poesia nasce de falta de entendimento, ou de
entendimento demais, poesia. Satisfação poética, talvez se assemelhe a
felicidade, aquela sensação de incomparável prazer que se sente ao terminar o
último verso, ao deixar um ponto de interrogação ao invés de ponto final,
então, é coisa linda de se fazer. Não muito disso é o que se salva quando se
tem felicidade. O amor talvez resolva estes problemas, daquilo que o homem
enganado chama “falta de inspiração”.
Esse amor, necessidade minha de sofrer para expressar a poesia da
alma. Esse amor, necessidade de suprir felicidade, em necessidade de se ter poesia,
viver de poesia, viver de nada, viver de abstração, de filosofia vã, de tudo. Viver
do vazio de amor, viver do que se faz quando se tem um vazio de amor, viver de
ausência, falta da vida propriamente dita, e viver até mesmo da morte de
espírito alheia. Vou mesmo é me esquecer da loira, da morena, esquecer de ser
homem, esquecer das eventuais falhas, que agora já não mais exercem o papel de
evento, mas tornaram-se característica firme e concreta em mim, homem, menino,
triste. Triste de amor, triste de ausência, triste de felicidade, triste por
qualquer outro motivo, mas triste sempre por poesia, viva ou morta, triste ou
não, mas poesia. E poesia feita de falta de felicidade. E que fique bem claro: não me importa a felicidade do mundo, ou o que ele procura. Eu me importo é com poesia, eu busco é poesia. Felicidade é obsoleta.
Nenhum comentário:
Postar um comentário