quarta-feira, 27 de junho de 2012

Mais Feminista Do Que Nunca

Ele chegou em casa, sentindo a sensação de estar esquecendo algo importante. Estava  exausto do trabalho e faminto, imaginando, em sua pseudo autoridade masculina dentro daquela casa, o maravilhoso jantar que lhe esperaria. Em vez disso, foi surpreendido por um beijo, antes que pudesse ao menos fazer a fatídica pergunta.
- Fiz algo para você.
Pensou ser óbvio ela estar tratando de um jantar especial. Pensou em luz de velas, não viu velas. Pensou até ter esquecido do aniversário de casamento, mas era só dali a dois meses. Deveria ser uma daquelas noites em que ela simplesmente lhe puxava pela gravata e o conduzia até o quarto, sem mesmo sentir o cheiro de arroz e feijão. Torceu para não ser; naquele caso, levaria horas para comer, de fato, algo. Acabou caindo na obviedade que lhe era peculiar:
- O jantar?
- Um poema.
Ela se abriu num sorriso, muito sedutora.
- Como é?
Ainda não sabia comer poesia. Fez cara de quem não entendeu e ela lhe entregou uma folha de papel, de um jeito tão bonitinho que ele não soube perguntar de mais nada. Leu o poema, que por sinal estava tão bonito quanto aquele frango assado que ela fizera no domingo. Ficou se perguntando se ainda teria algum pedaço, mas achou grosseria perguntar. Seus dias de canalhice, enquanto solteiro, lhe proporcionaram sabedoria para negociações conjugais como aquela. Decidiu então, contornar sua mulher com belas palavras, que é como os canalhas fazem. Sabia lidar com aquele tipo de situação sem deixá-la magoada. Era sensível como casca de ovo aquela mulher. Tudo o que se falava, e por vezes também o que não se falava poderia magoar. Puxou-a pelo braço e a colocou em seu colo. Elogiou o poema, o novo corte de cabelo, o vestido e também o bom e velho sorriso de menina. Disse até que ela teria futuro enquanto poetisa. Ela sorriu novamente, do modo mais meigo que alguém pode fazê-lo. Fingiu que acreditava. Por fim, mostrou-lhe a saborosa lasanha que ficaria pronta assim  que ele saísse do banho, e após o jantar, já certa do sucesso de seus planos maquiavélicos, puxou-o pela gola do pijama até o quarto, como a fazer o pobre esquecer por completo da final do campeonato de futebol na TV. 

Um comentário: