segunda-feira, 16 de março de 2015

O homem ao portão

Havia um homem ao portão de uma das casas da avenida principal. Ficava sempre lá, de pé, acenando aos carros que por ali passavam, fosse em alta velocidade, impossibilitando seus motoristas apressados de vê-lo, ou fosse lentamente, de modo que pudessem portanto distinguir sua fisionomia avançada em idade em meio aos vultos da cidade. Muitos, suponho, nunca o tenham visto, e muitos mais possivelmente nunca o virão, posto que o tempo é cruel e implacável, e a vida nos escapa pelas mãos fechadas como as águas escapam aos continentes.
Todavia, para ele, isso pouco parecia incomodar, e independentemente da chuva ou da luz rasgada do sol do meio dia, ele estaria sempre lá, no portão. Seu compromisso afinal, não era com a hipotética retribuição por educação ou por pena - muitos julgavam-no louco -, mas sim com o simples gesto de acenar, a quem quer que passasse na frente de sua casa.
Acenava, inclusive muitas vezes para mim, em meus dias mais tristes e vagos, sem esperar qualquer resposta, mesmo. Descobri anos mais tarde: assim seria o tão famigerado ato de amor.

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